sábado, 28 de fevereiro de 2015

O Estado Laico e a Democracia


A Constituição brasileira de 1824 estabelecia em seu artigo 5º:

A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo”.

A atual Constituição não repete tal disposição, nem institui qualquer outra religião como sendo a oficial do Estado. Ademais estabeleceu em seu artigo 19, I o seguinte: 

É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: 

I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.

Com base nesta disposição, o Estado brasileiro foi caracterizado como laico, palavra que, conforme o dicionário Aurélio, é sinônimo de leigo e antônimo de clérigo (sacerdote católico), pessoa que faz parte da própria estrutura da Igreja. Neste conceito, Estado leigo se difere de Estado religioso, no qual a religião faz parte da própria constituição do Estado. São exemplos de Estados religiosos o Vaticano, os Estados islâmicos e as vizinhas Argentina e Bolívia, em cujas constituições dispõem, respectivamente:

“Art. 2. El Gobierno Federal sostiene el culto Católico Apostólico Romano” – “Art. 3. Religion Oficial – El Estado reconoce y sostiene la religion Católica Apostólica y Romana. Garantiza el ejercício público de todo otro culto. Las relaciones con la Iglesia Católica se regirán mediante concordados y acuerdos entre el Estado Boliviano y la Santa Sede.”

Atualmente, o termo Estado laico vem sendo utilizado no Brasil como fundamento para a insurgência contra a instituição de feriados nacionais para comemorações de datas religiosas, a instituição de monumentos com conotação religiosa em logradouros públicos e contra o uso de símbolos religiosos em repartições públicas. Até mesmo a expressão “sob a proteção de Deus”, constante no preâmbulo da Constituição da República vem sendo alvo de questionamentos.

É importante ressaltar que o conceito de Estado laico não deve se confundir com Estado ateu, tendo em vista que o ateísmo e seus assemelhados também se incluem no direito à liberdade religiosa. É o direito de não ter uma religião conforme disse Pontes de Miranda: “liberdade de crença compreende a liberdade de ter uma crença e a de não ter uma crença” (Comentários à Constituição de 1967).

Assim sendo, confundir Estado laico com Estado ateu é privilegiar esta crença (ou não crença) em detrimento das demais, o que afronta a Carta Magna.

A Constituição da República apesar do disposto em seu artigo 19, inciso I protege a liberdade de crença, o livre exercício dos cultos religiosos e o faz da seguinte forma:

Art. 5.:VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
b) templos de qualquer culto;
Art. 210 § 1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.
Art. 213 - Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas.
Art. 226 § 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

Além das formas de colaboração estatal especificadas no texto constitucional, o próprio artigo 19, inciso I estabelece, de forma genérica, que no caso de interesse público, havendo lei, os entes estatais podem colaborar com os cultos religiosos ou igrejas, bem como não pode embaraçar-lhes o funcionamento.

Por estas razões, muito mais adequado do que chamar a República Federativa do Brasil de Estado laico, seria chamá-la de Estado plurireligioso, que aceita todas as crenças religiosas, sem qualquer discriminação, inclusive a não crença.

No entanto, conforme já aduzido, questão interessante surge na concepção de Estado plurireligioso, a respeito da forma a ser utilizada pelo Estado, em certas ocasiões, de optar pelo culto de determinada crença religiosa, quando isso implica em afastar outra. Especificando, porque permitir que se construa uma estátua do Cristo, e não a do Buda? Por inaugurar um logradouro público com o nome de Praça da Bíblia e não Praça do Alcorão? E porque não deixar de construir um monumento com conotação religiosa, com o fim de não ofender a consciência dos não crentes e a dos crentes de outras seitas?

Este impasse deve ser resolvido através da interpretação sistemática do texto constitucional.

Assim dispõe a Constituição da República em seu artigo 1º: 

A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito(...)Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Afirma a doutrina que o princípio da maioria, juntamente com os princípios da igualdade e da liberdade, é princípio fundamental da democracia. Aristóteles já dizia que a democracia é o governo onde domina o número.

Destas considerações, se pode aduzir que, embora o Estado deva dispensar tratamento igualitário a todas as religiões, bem como deixar que funcionem livremente, com base no princípio da maioria pode optar, quando necessário for, por determinada crença, como por exemplo na ocasião de instituir um feriado, de construir um monumento em logradouro público, de utilizar a expressão “Deus seja louvado” que consta no papel moeda em curso, bem como elaborar sua legislação tomando como base as orientações doutrinárias de um determinado credo, nisto incluindo questões polêmicas como aborto, uso de células de embriões humanos e união homoafetiva.

É importante frisar que tal posicionamento não visa beneficiar a Igreja Católica, cuja predominância no Brasil se deve às razões culturais e históricas decorrentes do processo de colonização que deu origem ao povo brasileiro maciçamente composto por descendentes de europeus católicos, além do fato de já ter sido religião oficial do país por mais de trezentos anos. Em vista disto, é perfeitamente natural que, sendo a maioria da população brasileira católica, como afirmam, que o culto católico tenha maior atenção estatal que os demais. Vale ressaltar que o que determina a preferência estatal por determinado credo é a vontade majoritária popular, que não obstante às razões históricas, pode se modificar, mormente como se vê nos tempos atuais em que asseitas evangélicas vêm ganhando força política, importando até mesmo na eleição de representantes. Ressalte-se ainda que a preferência da ação estatal por determinada religião não se situa apenas em âmbito nacional, mas também regional, sendo um exemplo a Constituição do Estado da Bahia, na qual o artigo 275 e incisos privilegiam a religião afro-brasileira, presumindo ser esta a preferência do povo baiano.

Embora o Estado deva respeitar e proteger os não crentes e os crentes de outros cultos, não nos parece adequado que o Estado deva suprimir de seu ofício qualquer alusão a determinado culto religioso, ou deixe de colaborar com este por causa de uma minoria insatisfeita, que tem toda a liberdade, constitucionalmente assegurada, de pregar a sua crença ou não crença, com o fim de conquistar novos adeptos, bem como eleger seus representantes para que defendam seus interesses perante o Estado.
                              
Por fim, vale também colocar que, de acordo com o artigo 19, inciso I da Constituição, é vedado ao Estado embaraçar o funcionamento dos cultos religiosos. Tal informação tem grande relevância, principalmente em face de situações concretas em que se postula ao Poder Judiciário pretensões no sentido fazer com que determinada religião haja em desconformidade com a sua doutrina, na maioria das vezes para satisfazer um capricho. Exemplo mais comum é pretender que a Igreja Católica realize casamento de pessoas divorciadas, o que vai de encontro com a sua doutrina que não reconhece o divórcio e veda a duplicidade de casamentos. Da mesma forma seria incabível a imputação do delito previsto no artigo 235 do Código Penal, no caso de religiões que permitam a prática da poligamia, desde que a multiplicidade de casamentos se restrinja ao âmbito da religião, sendo que estes casamentos não deverão produzir efeitos para o direito civil pátrio, por afrontar os princípios constitucionais que tratam da família. Nos demais casos, a intervenção estatal nos cultos religiosos deve se reger, como já foi aduzido, através de uma interpretação sistemática e harmônica do texto constitucional.

Conclusões

1. O Estado brasileiro, de acordo com a sua Constituição, deve dispensar tratamento igualitário a todas as crenças religiosas, incluindo a não crença, sem adotar nenhuma delas como sua religião oficial;
2. A inexistência de religião oficial no Estado não significa que o Estado seja partidário da não crença (ateísmo e assemelhados), pois, com base no princípio da liberdade religiosa, esta deve ser posta ao lado das demais religiões, não podendo junto com qualquer uma delas ser também considerada oficial;
3. Em caso de situações em que o Estado tenha que optar por favorecer uma determinada crença religiosa ou a não crença, o critério de escolha deve ser o princípio democrático da preferência da maioria, exprimida diretamente pelo povo ou através de seus representantes, ao contrário do que ocorre nos Estados que adotam religião oficial, que prevalecerá ainda que a maioria da população prefira outra;
4.  Não há qualquer inconstitucionalidade no fato do Estado, instituir um feriado, construir um monumento em logradouro público, fazer referências a Deus, bem como elaborar sua legislação tomando como base as orientações doutrinárias de um determinado credo, tendo em vista que se presume nesta atitude a expressão da livre vontade popular, que pode se modificar em favor de outra crença religiosa, sem que isto implique em modificação constitucional.

5. Com base no artigo 19, inciso I da Constituição da República, o Estado não pode intervir nas religiões de forma a compelir que ajam em desconformidade com a sua doutrina, sendo que, qualquer cerceamento à liberdade de culto, deve ser feita com base na interpretação sistemática da Constituição da República, de forma a harmonizar as suas disposições.


Fonte: Victor Mauricio Fiorito Pereira
Membro do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro


terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

ABORDAGENS POLICIAIS - CONHEÇA SEUS DIREITOS




De acordo com o Código de Processo Penal, a polícia pode abordar as pessoas e revistá-las sempre que presenciar alguma atitude suspeita. 


Vejam abaixo as orientações do Ministério Público do Paraná sobre como o cidadão deve agir durante a abordagem policial.

ABORDAGENS EM AMBIENTE ABERTO - A Polícia está autorizada a abordar pessoas que estejam na rua ou em ambiente aberto ao público, como bares, quando houver indícios de existência de crime (porte de armas, de drogas ou qualquer objeto cujo porte seja proibido). Esta autorização abrange todas as pessoas que estejam no local ou na situação. A abordagem normalmente se destina a identificar a pessoa (daí a facilidade de quem porta os documentos) e inclui revista pessoal, que consiste em revistar a pessoa e seus objetos, contidos ou não em bolsas ou valises. De regra, mulheres devem ser revistadas apenas por policiais mulheres.

Sobre o porte de documentos: 

Andar sem documentos é crime?


Não é crime andar sem documentos, mas recusar-se a se identificar é contravenção penal. Se estiver sem documento, forneça ao policial dados que auxiliem a sua identificação. Vejam o que diz a Lei de Contravenções Penais:



Art. 68. Recusar à autoridade, quando por esta, justificadamente solicitados ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado, profissão, domicílio e residência:

Pena – multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.

Parágrafo único. Incorre na pena de prisão simples, de um a seis meses, e multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis, se o fato não constitue infração penal mais grave, quem, nas mesmas circunstâncias, faz declarações inverídicas a respeito de sua identidade pessoal, estado, profissão, domicílio e residência.

Lembrando que o Código Penal é de 1940.

Não há lei no Brasil que te obrigue a andar com documentos. No entanto, os(as) policiais podem te pedir os documentos e, se você não estiver com eles, os(as) policiais podem perguntar o nome do seu pai, da sua mãe e sua data de nascimento. Você não é obrigado(a) a responder nada além disso. Não precisa dizer de onde vem, para onde vai, se tem passagens pela polícia, se conhece fulano de tal, pois isto foge da finalidade da “dura”. Recomenda-se, no entanto, andar com documentos.


ABORDAGENS DE VEÍCULOS - A Polícia está autorizada a revistar veículos, quando houver indícios de existência de crime (posse de arma, de explosivos, de drogas, por exemplo).


REVISTA NA CASA - A revista na moradia, conhecida como busca e apreensão em domicílio, só pode ser feita com autorização do proprietário ou com autorização judicial. Só não é preciso autorização se houver indicação de que está acontecendo algum crime (como agressão ou tráfico de drogas), em caso de desastre ou se for necessário para prestar socorro. A busca normalmente é feita para procurar armas, drogas, documentos, computadores e objetos ou dinheiro ilícito. 


AUTORIZAÇÃO LEGAL DE PRISÃO - A pessoa só pode ser presa se houver ordem judicial (mandado de prisão pendente) ou se houver flagrante (alguém cometendo um crime, acabando de cometer, perseguido por qualquer pessoa após o crime ou estando com objeto de crime). A prisão se configura por um conjunto de atos: abordagem, voz de prisão, encaminhamento à delegacia e lavratura do auto (documento da prisão). 


RESPEITO - Os policiais têm obrigação de respeitar as pessoas quando das abordagens e das revistas. Cometem crime de tortura, de lesão ou morte, ou de abuso de autoridade, entre outros, quando agridem injustificadamente as pessoas, quer por atos quer por palavras. Por outro lado, os cidadãos abordados pelos policiais devem respeitá-los e obedecer às determinações legais daqueles.


USO DA FORÇA E ALGEMAS - O uso da força pelos policiais para fazer a prisão é permitido quando houver resistência ou tentativa de fuga. As algemas podem ser usadas também quando houver perigo à integridade física do policial ou de terceiros.


IDENTIFICAÇÃO DOS POLICIAIS – Principalmente quando preso em flagrante o cidadão tem direito de saber a identidade dos policiais que estão fazendo a abordagem e prisão, bem como a identidade do delegado a quem for apresentado na delegacia.


EXAME DA LEGALIDADE DA PRISÃO – O Delegado de Polícia que lavrar o auto de prisão em flagrante tem que comunicar imediatamente a prisão ao Juiz e ao Promotor de Justiça, e estes analisam se a prisão foi legal. Além dessas autoridades, também a família do preso (ou pessoa que o preso indicar) é comunicada imediatamente da prisão e do lugar onde se encontra o preso, para assim poder procurar um advogado para que este também possa discutir a legalidade da prisão e pedir a liberdade provisória do preso. Lembre que o momento de abordagem não é adequado para discutir o que é ou não regular ou legal. Converse com seu advogado, e se achar que teve seus direitos violados, faça uma queixa formal à Corregedoria da Polícia Civil, Militar, Federal ou Rodoviária (conforme a categoria do policial que o tenha abordado) e entre em contato com o Ministério Público.

COMO O CIDADÃO DEVE AGIR EM CASO DE ABORDAGEM POR POLICIAIS:

• Não tente fugir, não ofereça resistência e atenda às determinações.
• Fique calmo e aja respeitosamente.
• Não use palavras agressivas, não faça movimentos bruscos ou que possam ser interpretados como tentativa de fuga ou de agressão.
• Mantenha suas mãos visíveis o tempo todo.
• Não toque o policial e jamais resista, mesmo que seja inocente do que foi acusado.
• Não discuta, não insulte, não ameace apresentar queixa contra o policial.
• Responda de modo claro e pausado às perguntas que forem pertinentes. Se não quiser responder, diga de modo respeitoso que não vai fazê-lo.
• É conveniente sempre identificar-se de modo claro e completo. Se tiver um documento com foto apresente-o ao policial. Se estiver sem documentos, procure se identificar de forma clara. Se lembrar, diga o número de seu RG ou CPF. Mentir sobre a própria identidade passando-se por outra pessoa constitui crime.
• Se houver pessoas (parente ou amigo) que queiram acompanhá-lo à Delegacia de Polícia, solicite que o policial informe a qual distrito será levado.
• Você somente pode ser preso pelo que fez ou disse. A polícia não pode prender você por não dizer algo.
• Não interfira ou obstrua uma ação policial. Se pedir esclarecimentos, faça-o de modo natural e educado, mas se não receber explicações, não discuta.


COMO O CIDADÃO DEVE AGIR QUANDO FOR LEVADO PRESO:

• O preso deve ser levado à Delegacia de Polícia.
• O preso tem o direito de permanecer calado. Entretanto, pode dar explicações que poderão ser consideradas a seu favor pelo Promotor de Justiça e Juiz quando receberem cópia do auto de prisão. Não convém oferecer explicações, desculpas ou justificativas falsas. Lembre que sua defesa deverá ser feita perante um Juiz em momento posterior e antes da audiência em juízo você tem direito de falar reservadamente com seu advogado.
• Ao ser apresentado ao delegado, informe se foi agredido, mas não minta, porque você pode responder por mais um crime (denunciação caluniosa ou outro).
• O preso deve assinar o auto de prisão em flagrante. Em até 24 horas o Delegado de Polícia deve entregar ao preso a nota de culpa com o motivo de prisão, o nome do condutor e os das testemunhas (normalmente policiais). 
• Se a prisão for por ordem judicial uma cópia do mandado deverá ser entregue ao preso logo depois da prisão, com declaração do dia, lugar e hora da prisão.


COMO O CIDADÃO DEVE AGIR EM CASO DE SER ABORDADO NO VEÍCULO:

• Apresente sua carteira de habilitação e os documentos do veículo.
• A Polícia poderá revistar seu veículo se houver suspeita de crime em curso ou que nele possa existir algo ligado a crime (transporte de drogas, posse não autorizada de armas, etc.).
• Policiais podem fazer revista pessoal no motorista e nos passageiros se houver indício de que esteja envolvido com um crime ou cometendo um (como estar armado). Em caso de suspeita de irregularidade com o veículo este pode ser retido.
• Se o policial suspeitar que você está sob efeito de álcool ou drogas, ele não poderá obrigá-lo a fazer o teste do bafômetro, mas poderá conduzi-lo (se houver razoáveis indícios) à Delegacia de Polícia.


COMO O CIDADÃO DEVE AGIR NO CASO DE POLICIAIS ENTRAREM EM SUA CASA:

• A polícia não pode entrar em sua casa sem sua autorização ou sem ordem assinada por um Juiz. Mas, se houver suspeita de que na casa está havendo um crime (como tráfico de drogas ou mercadorias ou objetos sem origem lícita) não é necessário autorização.
• Você tem direito de ser informado do propósito da busca e apreensão que consta no mandado (expedido pelo Juiz). Recomenda-se que colabore indicando onde se encontram os documentos ou objetos buscados.
• Ao ser notificado da busca, procure colaborar informando quem se encontra na casa, onde, e quando for o caso, o motivo.

UM MAL EXEMPLO: 



Uma motorista abordada por dois policiais militares, no Rio de Janeiro, foi autuada por desacato depois de gritar com um dos PMs e afirmar que é "arquiteta" e que conhecia o comandante de uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora). Parte da abordagem foi filmada pelo policial, que não teve o nome divulgado, e rapidamente se espalhou pelas redes sociais. O vídeo foi apresentado por ele na 42ª DP (Recreio dos Bandeirantes).
No início da gravação, a arquiteta Ana Maria Lucas de Souza, 50, fala ao celular, dentro do carro, e é solicitada pelo policial a entregar sua carteira de habilitação e o documento do veículo. "Você é novo, eu sou mais velha do que você, eu sei disso", responde a mulher, que aparenta estar nervosa. O PM afirma que está fazendo o seu trabalho, no que ela interrompe: "Eu sou arquiteta, eu estou fazendo obras com várias UPPs, se você quer saber".
Ana Maria é dona da empresa "Obra Prima Engenharia e Arquitetura", segundo confirmou por telefone à reportagem uma funcionária do escritório.
Durante a abordagem, a arquiteta, aos gritos, diz que foi desrespeitada e que o outro policial "veio com a arma para cima" dela. O policial afirma, em seguida, que teve de acompanhar o carro dela por dois quilômetros e que a motorista havia se recusado a parar inicialmente.
A mulher então diz que vai com o policial até a delegacia e, no telefone, reclama: "Eles têm de ir atrás de bandido. Eu vou falar com o comandante e vou anotar o número deles". Em certo momento, ela ainda diz que os PMs estão lhe "desacatando" na porta de casa.
Ao perceber que estava sendo filmada, a arquiteta bate com a mão na câmara e declara: "Não adianta você filmar, não".
Na 42ª DP, Ana Maria foi autuada por desacato pelo delegado Marcos Cipriano de Oliveira Mello, titular da delegacia, segundo a Polícia Civil. O inquérito já foi enviado para o 9º Juizado Especial Criminal, da Barra da Tijuca.
Em entrevista ao jornal "Extra", o policial afirmou que moverá uma ação contra a arquiteta por constrangimento. Ele afirmou que já consultou um advogado sobre o processo em âmbito particular.

Lembrando que segundo o Código Penal:

Artigo 331 do CP: “Desacato: Desacatar  funcionário  público no exercício da função ou em razão delaPena: detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa –competência dos juizados especiais criminais, podendo, o réu ser beneficiado com o instituto da transação penal (Constituem infrações de menor potencial ofensivo: crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa). 

VÍDEO COMPLETO:


Por isso vale lembrar o ditado popular "quem não deve não teme". Colabore com o trabalho da Polícia, pois ela está trabalhando para o bem estar de todos.

                                   
 

NO CASO DE ABUSO

Se algum policial desrespeitar os seus direitos, tente se lembrar e anotar o nome, a identificação e a aparência dele, o número da viatura em que ele estava e o nome das testemunhas que presenciaram os fatos e peça seus nomes e números de telefones.
Se você for vítima de violência, tortura, extorsão, maltrato, discriminação ou humilhação praticados por policiais, procure a Ouvidoria de Polícia do seu Estado. Procure lembrar ou anotar a identificação dos policiais e das viaturas.
Assim que puder, anote tudo o que for relacionado à abordagem sofrida.
Se sofrer alguma lesão tire fotos dos ferimentos; caso seja necessário procure atendimento médico imediato e peça ao médico que faça um laudo descrevendo as lesões sofridas e suas causas prováveis. Há programas de domínio público de movimentos de proteção de direitos humanos, para gravar a abordagem por meio de celular. 
Os bons policiais e a sociedade como um todo ficaram muito gratos em identificar maus profissionais, para que sejam sancionados à altura.
Lembrando ainda que é possível reparação por danos. Procure um advogado de confiança e verifique a possibilidade de ingressar com ação judicial.

                      


Referências:

Código Penal Brasileiro Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm.

DIREITO DAS PESSOAS DURANTE A ABORDAGEM POLICIAL. Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Disponível em: http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/31/Documentos/DIREITO%20DAS%20PESSOAS%20DURANTE%20A%20ABORDAGEM%20POLICIAL.pdf. Acesso em 10 de fev de 2015.

MINAS GERAIS. Polícia Militar. Abordagem, Busca e Identificação. Manual de Prática Policial Nº 1. Belo Horizonte, 1981. 

Orientações. Ministério Público do Estado do Paraná. Disponível em http://www.gaeco.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=61. Acesso em 09 de fev de 2015.

Motorista grita com PM e é autuada por desacato no Rio. Disponível em: http://zip.net/bcqJM4Acesso em 09 de fev de 2015.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

O “Perfeito Mundo” sem Advogados


Texto adaptado do melhor artigo que li sobre o valor da Advocacia Brasileira, escrito pelo Dr. Thiago Araujo, renomado advogado civilista e um dos destaques do Programa de Coaching para Advogados, o FGA.


Introdução

Advogados costumam receber vários adjetivos. Raramente são bons. A ganância e a advocacia são associadas frequentemente por boa parte das pessoas, ainda que muitas não tenham coragem para dizer isso.
Associa-se o pensamento ao fato de advogado ser remunerado para resolver problemas que, não raro, mexem psicologicamente com as pessoas ou afetam a sociedade como um todo. Talvez no imaginário popular devessem ser anjos celestiais, desprendidos de interesses materiais que o resto das pessoas possuem. As pessoas acham isso ruim, embora se comportem como aquilo que dizem repudiar.
Ironicamente os advogados são condenados pela sociedade por terem aquilo que ela precisa, por não fazem o que a sociedade quer, por não seguirem a premissa de que os direitos devem ter como norte a capacidade, e não a necessidade.
A sociedade ensina desde a tenra idade a associar o dinheiro ao mal. A desassociação do trabalho (causa) e lucro (efeito) é a raiz perversa de todo esse problema.
Os advogados não têm o poder de parar o “motor do mundo”, mas sem eles certamente será destruída uma de suas engrenagens: a liberdade. Ela abrange ou influencia todos os outros direitos.
Alguns dirão que a vida ficará melhor sem os advogados, que a ganância desaparecerá e que haverá outros meios de as pessoas se defenderem ou serem defendidas. O Estado fornece tudo, até defensores. Talvez até defendam que o equilíbrio será finalmente alcançado pois advogados incentivam litígios. Não é mesmo, Poder Judiciário?
Será mesmo?
Para eles, os advogados devem viver da satisfação de ajudar, e não para ganhar dinheiro. Devem se preocupar com o que os outros sentem, mesmo existindo psicólogos e psiquiatras. Devem entender as dificuldades financeiras dos outros, mesmo existindo bancos.
Talvez eles tenham razão. Vamos analisar sob a perspectiva deles.

Advogados, saiam!

Advogados civilistas, desapareçam! Deixem que contratos sejam desrespeitados ou mal executados por causa de aspectos técnicos fora do alcance de leigos. Que dívidas não sejam pagas e os credores cheguem a penúria! Quem sabe não voltem ao fenomenal período onde quem não tinha dinheiro se tornava escravo? Para eles talvez isso sim seja o ato sublime de servir ao outro!
Que famílias se destruam de dentro para fora e com isto gerem seres lastimáveis que tornem cada vez pior esta sociedade, e contribuam ainda mais com a onda de crimes e selvageria! Que crianças geradas em uma noite de balada nunca saibam quem são seus pais e nunca recebam alimentos! Que os que precisem de interdição sejam todos taxados como loucos e largados em hospícios que mais parecem campos de concentração! Que a adoção seja feita não dentro dos parâmetros de melhor interesse a criança, mas sim como quem compra meio quilograma de amendoim ou um cacho de bananas na feira.
Que o direito de propriedade desapareça! Que os invasores sejam o perfil moral padrão da humanidade. Deixem que uns trabalhem para outros colherem sozinhos. Eles não só querem, como merecem isso!
Que herdeiros resolvam suas pendências não através do devido processo legal, mas fazendo uso de facas e armas de fogo! Afinal, é o direito é deles, e nada pode os impedir!
Advogados consumeristas, não sejam inoportunos! Não percebem que uma relação social saudável se baseia na liberdade para fazer tudo como quiser? Deixem as empresas destruírem a honra das pessoas inserindo seus nomes em cadastros restritivos de crédito! Deixem que as empresas vendam produtos e serviços sem fornecê-los! E daí se as pessoas estão sem água e luz, mesmo pagando? Que façam “gatos”! Isso é moralmente belo!
Deixem as pessoas pagarem além do que realmente vale o produto ou serviço! Se não quiserem, que não comprem! Que produtos com defeito sejam vendidos em larga escala, produzidos de qualquer maneira, e no fim, o consumidor prove o defeito e não encontre responsáveis. Nem o fabricante nem o vendedor, nem ninguém.
Que produtos faltem em estoques e fique por isso mesmo. Ah, bons tempos da SUNAB! Bons tempos em que o Código de Defesa do Consumidor não existia, essa praga, fruto da ganância!
Deixem empresas serem enganadas com fraudes em relações de consumo para que espertalhões sejam indenizados! Elas preferem pagar pouco e não se precaver! Deixem que consumidores comprem e não paguem! Por que incentivar a ganância? Afinal, tudo não é de todos? Não entrem nessa onda de prevenção! Isso é coisa de gente que não tem valores morais elevados!
Consumeristas, vocês atrapalham!
Advogados trabalhistas, sumam deste mundo onde são completamente desnecessários! Deixem as pessoas trabalharem feito animais. Talvez elas prefiram o açoite a advertências e suspensões! Que ambientes de trabalho sejam mais descontraídos e apelidos referentes a cor, altura, gênero e orientação sexuais, religião e atributos físicos sejam livres! Vocês não têm senso de humor!
Não se intrometam nas horas trabalhadas a mais sem remuneração. Eles querem servir uns aos outros. Ganhar pelo trabalho é egoísmo. Esqueceram o motivo pelo qual devemos sumir? Que importa se eles recebem valores a menor em seus salários? Muito dinheiro implica em ganância! E isso é mau, muito mau!
Empresas gostam de condenações de vez em quando! Não interfiram no ato de caridade que é se permitir ser condenado judicialmente a dar dinheiro a um empregado que mente ou cria histórias sabendo da realidade desorganizada da empresa! Para eles, fraudes nada mais são que uma forma de equilibrar desigualdades históricas!
Advogados criminalistas, não fossem vocês, teríamos ruas com bem menos criminosos! Por que insistir em defender pessoas que podem ou não terem cometido delitos? Quem se importa? Se a polícia acha que é, então é. E se não for, é melhor pecar pelo excesso que pela falta! Para eles, é melhor um inocente preso a um culpado solto. Nunca o contrário! E se provarem que foi um erro? Ah, não se pode ganhar todas!
Deixe um réu se defender sozinho diante da figura benevolente e compreensiva do Estado. Inocente ou culpado, a prisão sempre é boa, pois é um ato de penitência que transforma maus em bons, e bons em anjos de luz!
Aos advogados constitucionalistas só há necessidade de dizer que o Estado se justifica em si mesmo. Portanto, fiscalizar e exigir cumprimento é como exigir a um motorista que dirija. Eles sempre sabem o que fazem. Não duvidem!
Advogados tributaristas, por favor, entendam que nada há de errado em deixar o Estado tomar um pouco mais de dinheiro de pessoas físicas ou jurídicas. Pode ser só um erro de cálculo. Se não for, justifica-se pelo bem maior que é o interesse público! Uns zeros a mais a direita não podem ser motivo de litígios desnecessários. Dizer que atua contra distorções tributárias que ajudam a desonerar de forma a incentivar o consumo e a geração de empregos ou outros projetos relevantes é conversa de advogado querendo ganhar dinheiro à custa dos outros! A quem vocês querem enganar?
Advogados administrativistas, ninguém se importa se o Estado quiser tomar sua propriedade e pagar, se e quando quiser. A propriedade privada é o mal a ser extirpado! Deixem o Estado contratar sem licitação, ou fazendo dentro do emaranhado de regras confusas criadas com o propósito de incentivar empresas que precisam de ajuda!
Não lutem na Justiça para que direitos como a internação em rede pública hospitalar ou concessão de medicamentos sejam feitas! Morrer é um ato de amor a humanidade, afinal, o mundo está cheio de gente! Regras de concursos públicos são mutáveis em nome do interesse público, o que autoriza a violação, pois sempre é para o bem!
Querem ser livres em seus contratos, e não deixam o Estado ser só porque o dinheiro na verdade pertence a todos? Mas que petulância! Não tem vaga na escola pública? Vá para uma particular! Não pode pagar? E daí? Estudar é luxo!
E os servidores públicos? Por que defendê-los quando um ou outro direito é violado? Já possuem o privilégio de viver dentro da casa chamada Estado, não na senzala. Reclamam de barriga cheia!
Parem de dar voz aos que gostam de fiscalizar o Estado com ações populares! O Estado para elas é Deus! Elas querem comer as migalhas que caem da mesa de seus nobilíssimos dirigentes!
Chega de intromissão!
Advogados empresariais, as empresas se organizam por elas mesmas. Não precisam de vocês! Ainda mais em um país como este, que não tem sistemas normativos confusos, contraditórios e ambíguos! Isso é querer dinheiro fácil! Deixem falências ocorrerem a torto e direito! E nada de processo! Credores devem ser legitimamente saqueadores, e violência será justificada nesse modelo social tão exemplar!
Aos advogados previdenciaristas resta a última reprimenda por serem os gananciosos que roubam pobres trabalhadores que não conseguem se aposentar porque o Estado não pode pagar para que esses “deitões” fiquem em casa descansando após míseras décadas de trabalho. Mas, se por um acaso o gentil Estado entender que eles devem se aposentar porque vocês assim conseguiram, não queiram ser remunerados por isso! Todos podem, mas não os advogados!
Parem de colocar na cabeça das pessoas que elas possuem direito a descansar após tanto trabalho! E também de se dispor a resolver isso! Tal como o homem que oferece carona a uma mulher por interesses pérfidos, vocês, oferecendo serviços a essa gente estão querendo se aproveitar, não ajudar. Portanto, remunerá-los é presentear o egoísmo, a ganância e a falta de sentimentos morais mais elevados! Largue-os à morte em vida! Deixem que fiquem à míngua! É isso que eles querem! Uma vida de provações, rumo ao céu!
Vejam só quantos danos os advogados ajudam a causar em uma sociedade. 

O Estado Sempre é Bom. Não Reclamem!

E daí que não tem Defensoria Pública? E daí se, quando tem, nunca dá conta de tudo? E daí se o Ministério Público não cobra? E daí se o Judiciário existe para julgar, mas reclama do excesso de demandas, tal como o cobrador do ônibus que reclama pelo fato de seu dinheiro não estar trocado?
É imoral querer que o Estado crie mecanismos para fiscalizar a ele mesmo e ajudar os cidadãos a se defender dele mesmo, sendo julgado por ele mesmo! Não percebem isso? Vejam o alvoroço que causaram!

Conclusão

A sociedade tem o direito a autodestruição. Sem os advogados será concedido  esse desejo, pois eles fomentariam a luta pelos direitos. 

A sociedade só precisa de três leis: a da selva, da de Talião (olho por olho, dente por dente) e a do mais forte. As derivações também são válidas. E é justamente isso que aparentemente o publico anseia e infelizmente caminha.
A permanência do advogado só serve para quebrar essa lógica. Mas alguns já disseram que não os querem. 
Sim, o Estado pode fazer o papel dos advogados! E certamente fará isso! Mas não atingirá seu fim. Nenhum Estado pode ser bom sem controle fora dele. Relações sociais que se desequilibram, uma vez assim, dificilmente voltarão a ser plenamente equilibradas sem a presença dos advogados. Será um colapso. Mas quem se importa com isso? Por que enxergar as coisas sempre de forma pessimista? Por que temer pelo que pode dar errado? 



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