Texto adaptado do melhor artigo que li sobre o valor da Advocacia Brasileira, escrito pelo Dr.
Thiago Araujo, renomado advogado civilista e um dos destaques do Programa de
Coaching para Advogados, o FGA.
Introdução
Advogados costumam
receber vários adjetivos. Raramente são bons. A ganância e a advocacia são
associadas frequentemente por boa parte das pessoas, ainda que muitas não
tenham coragem para dizer isso.
Associa-se o pensamento
ao fato de advogado ser remunerado para resolver problemas que, não raro, mexem
psicologicamente com as pessoas ou afetam a sociedade como um todo. Talvez no
imaginário popular devessem ser anjos celestiais, desprendidos de interesses
materiais que o resto das pessoas possuem. As pessoas acham isso ruim, embora se comportem como
aquilo que dizem repudiar.
Ironicamente os advogados são condenados pela sociedade por terem aquilo que ela precisa, por não fazem o que a sociedade quer, por não seguirem a premissa de que os direitos devem ter como norte a capacidade, e não a necessidade.
A sociedade ensina desde a tenra idade a associar o dinheiro ao mal. A
desassociação do trabalho (causa) e lucro (efeito) é a raiz perversa de todo
esse problema.
Os advogados não têm o poder de
parar o “motor do mundo”, mas sem eles certamente será destruída uma de suas engrenagens: a liberdade. Ela abrange ou influencia
todos os outros direitos.
Alguns dirão que a vida
ficará melhor sem os advogados, que a ganância desaparecerá e que haverá outros
meios de as pessoas se defenderem ou serem defendidas. O Estado fornece tudo,
até defensores. Talvez até defendam que o equilíbrio será finalmente alcançado pois advogados
incentivam litígios. Não é mesmo, Poder Judiciário?
Será mesmo?
Para eles, os advogados devem viver
da satisfação de ajudar, e não para ganhar dinheiro. Devem se preocupar com
o que os outros sentem, mesmo existindo psicólogos e psiquiatras. Devem entender
as dificuldades financeiras dos outros, mesmo existindo bancos.
Talvez eles tenham
razão. Vamos analisar sob a perspectiva deles.
Advogados, saiam!
Advogados civilistas,
desapareçam! Deixem que contratos sejam desrespeitados ou mal executados por
causa de aspectos técnicos fora do alcance de leigos. Que dívidas não sejam
pagas e os credores cheguem a penúria! Quem sabe não voltem ao fenomenal período
onde quem não tinha dinheiro se tornava escravo? Para eles talvez isso sim seja
o ato sublime de servir ao outro!
Que famílias se destruam
de dentro para fora e com isto gerem seres lastimáveis que tornem cada vez pior
esta sociedade, e contribuam ainda mais com a onda de crimes e selvageria! Que
crianças geradas em uma noite de balada nunca saibam quem são seus pais e nunca
recebam alimentos! Que os que precisem de interdição sejam todos taxados como
loucos e largados em hospícios que mais parecem campos de concentração! Que a
adoção seja feita não dentro dos parâmetros de melhor interesse a criança, mas
sim como quem compra meio quilograma de amendoim ou um cacho de bananas na
feira.
Que o direito de
propriedade desapareça! Que os invasores sejam o perfil moral padrão da
humanidade. Deixem que uns trabalhem para outros colherem sozinhos. Eles não só
querem, como merecem isso!
Que herdeiros resolvam
suas pendências não através do devido processo legal, mas fazendo uso de facas
e armas de fogo! Afinal, é o direito é deles, e nada pode os impedir!
Advogados consumeristas,
não sejam inoportunos! Não percebem que uma relação social saudável se baseia
na liberdade para fazer tudo como quiser? Deixem as empresas destruírem a honra
das pessoas inserindo seus nomes em cadastros restritivos de crédito! Deixem
que as empresas vendam produtos e serviços sem fornecê-los! E daí se as pessoas
estão sem água e luz, mesmo pagando? Que façam “gatos”! Isso é moralmente belo!
Deixem as pessoas
pagarem além do que realmente vale o produto ou serviço! Se não quiserem, que
não comprem! Que produtos com defeito sejam vendidos em larga escala,
produzidos de qualquer maneira, e no fim, o consumidor prove o defeito e não
encontre responsáveis. Nem o fabricante nem o vendedor, nem ninguém.
Que produtos faltem em estoques e fique por isso mesmo. Ah, bons
tempos da SUNAB! Bons tempos em que o Código de Defesa do Consumidor não existia, essa praga, fruto da
ganância!
Deixem empresas serem
enganadas com fraudes em relações de consumo para que espertalhões sejam
indenizados! Elas preferem pagar pouco e não se precaver! Deixem que
consumidores comprem e não paguem! Por que incentivar a ganância? Afinal, tudo
não é de todos? Não entrem nessa onda de prevenção! Isso é coisa de gente que
não tem valores morais elevados!
Consumeristas, vocês
atrapalham!
Advogados trabalhistas,
sumam deste mundo onde são completamente desnecessários! Deixem as pessoas
trabalharem feito animais. Talvez elas prefiram o açoite a advertências e
suspensões! Que ambientes de trabalho sejam mais descontraídos e apelidos
referentes a cor, altura, gênero e orientação sexuais, religião e atributos
físicos sejam livres! Vocês não têm senso de humor!
Não se intrometam nas
horas trabalhadas a mais sem remuneração. Eles querem servir uns aos outros.
Ganhar pelo trabalho é egoísmo. Esqueceram o motivo pelo qual devemos sumir?
Que importa se eles recebem valores a menor em seus salários? Muito dinheiro
implica em ganância! E isso é mau, muito mau!
Empresas gostam de
condenações de vez em quando! Não interfiram no ato de caridade que é se permitir
ser condenado judicialmente a dar dinheiro a um empregado que mente ou cria
histórias sabendo da realidade desorganizada da empresa! Para eles, fraudes
nada mais são que uma forma de equilibrar desigualdades históricas!
Advogados criminalistas,
não fossem vocês, teríamos ruas com bem menos criminosos! Por que insistir em
defender pessoas que podem ou não terem cometido delitos? Quem se importa? Se a
polícia acha que é, então é. E se não for, é melhor pecar pelo excesso que pela
falta! Para eles, é melhor um inocente preso a um culpado solto. Nunca o
contrário! E se provarem que foi um erro? Ah, não se pode ganhar todas!
Deixe um réu se defender
sozinho diante da figura benevolente e compreensiva do Estado. Inocente ou
culpado, a prisão sempre é boa, pois é um ato de penitência que transforma maus
em bons, e bons em anjos de luz!
Aos advogados
constitucionalistas só há necessidade de dizer que o Estado se justifica em si
mesmo. Portanto, fiscalizar e exigir cumprimento é como exigir a um motorista
que dirija. Eles sempre sabem o que fazem. Não duvidem!
Advogados tributaristas,
por favor, entendam que nada há de errado em deixar o Estado tomar um pouco
mais de dinheiro de pessoas físicas ou jurídicas. Pode ser só um erro de
cálculo. Se não for, justifica-se pelo bem maior que é o interesse público! Uns
zeros a mais a direita não podem ser motivo de litígios desnecessários. Dizer
que atua contra distorções tributárias que ajudam a desonerar de forma a
incentivar o consumo e a geração de empregos ou outros projetos relevantes é
conversa de advogado querendo ganhar dinheiro à custa dos outros! A quem vocês
querem enganar?
Advogados
administrativistas, ninguém se importa se o Estado quiser tomar sua propriedade
e pagar, se e quando quiser. A propriedade privada é o mal a ser extirpado!
Deixem o Estado contratar sem licitação, ou fazendo dentro do emaranhado de
regras confusas criadas com o propósito de incentivar empresas que precisam de
ajuda!
Não lutem na Justiça
para que direitos como a internação em rede pública hospitalar ou concessão de
medicamentos sejam feitas! Morrer é um ato de amor a humanidade, afinal, o
mundo está cheio de gente! Regras de concursos públicos são mutáveis em nome do
interesse público, o que autoriza a violação, pois sempre é para o bem!
Querem ser livres em
seus contratos, e não deixam o Estado ser só porque o dinheiro na verdade
pertence a todos? Mas que petulância! Não tem vaga na escola pública? Vá para
uma particular! Não pode pagar? E daí? Estudar é luxo!
E os servidores
públicos? Por que defendê-los quando um ou outro direito é violado? Já possuem
o privilégio de viver dentro da casa chamada Estado, não na senzala. Reclamam
de barriga cheia!
Parem de dar voz aos que
gostam de fiscalizar o Estado com ações populares! O Estado para elas é Deus!
Elas querem comer as migalhas que caem da mesa de seus nobilíssimos dirigentes!
Chega de intromissão!
Advogados empresariais,
as empresas se organizam por elas mesmas. Não precisam de vocês! Ainda mais em
um país como este, que não tem sistemas normativos confusos, contraditórios e
ambíguos! Isso é querer dinheiro fácil! Deixem falências ocorrerem a torto e
direito! E nada de processo! Credores devem ser legitimamente saqueadores, e
violência será justificada nesse modelo social tão exemplar!
Aos advogados
previdenciaristas resta a última reprimenda por serem os gananciosos que roubam
pobres trabalhadores que não conseguem se aposentar porque o Estado não pode
pagar para que esses “deitões” fiquem em casa descansando após míseras décadas
de trabalho. Mas, se por um acaso o gentil Estado entender que eles devem se
aposentar porque vocês assim conseguiram, não queiram ser remunerados por isso!
Todos podem, mas não os advogados!
Parem de colocar na
cabeça das pessoas que elas possuem direito a descansar após tanto trabalho! E
também de se dispor a resolver isso! Tal como o homem que oferece carona a uma
mulher por interesses pérfidos, vocês, oferecendo serviços a essa gente estão
querendo se aproveitar, não ajudar. Portanto, remunerá-los é presentear o
egoísmo, a ganância e a falta de sentimentos morais mais elevados! Largue-os à
morte em vida! Deixem que fiquem à míngua! É isso que eles querem! Uma vida de
provações, rumo ao céu!
Vejam só quantos danos
os advogados ajudam a causar em uma sociedade.
O Estado Sempre é Bom. Não Reclamem!
E daí que não tem
Defensoria Pública? E daí se, quando tem, nunca dá conta de tudo? E daí se o
Ministério Público não cobra? E daí se o Judiciário existe para julgar, mas
reclama do excesso de demandas, tal como o cobrador do ônibus que reclama pelo
fato de seu dinheiro não estar trocado?
É imoral querer que o
Estado crie mecanismos para fiscalizar a ele mesmo e ajudar os cidadãos a se
defender dele mesmo, sendo julgado por ele mesmo! Não percebem isso? Vejam o
alvoroço que causaram!
Conclusão
A sociedade tem o
direito a autodestruição. Sem os advogados será concedido esse desejo, pois eles fomentariam a luta pelos
direitos.
A sociedade só precisa de três leis: a da selva, da de Talião (olho por olho, dente por dente) e a do mais forte. As derivações também são válidas. E é justamente isso que aparentemente o publico anseia e infelizmente caminha.
A sociedade só precisa de três leis: a da selva, da de Talião (olho por olho, dente por dente) e a do mais forte. As derivações também são válidas. E é justamente isso que aparentemente o publico anseia e infelizmente caminha.
A permanência do advogado só
serve para quebrar essa lógica. Mas alguns já disseram que não os querem.
Sim, o Estado pode fazer
o papel dos advogados! E certamente fará isso! Mas não atingirá seu fim. Nenhum
Estado pode ser bom sem controle fora dele. Relações sociais que se
desequilibram, uma vez assim, dificilmente voltarão a ser plenamente
equilibradas sem a presença dos advogados. Será um colapso. Mas quem se importa
com isso? Por que enxergar as coisas sempre de forma pessimista? Por que temer
pelo que pode dar errado?
Texto completo: http://thiagoaraujoadvocacia.jusbrasil.com.br/artigos
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